Não tenho dinheiro, o que me obrigou a enfrentar a proprietária da casa com o intuito de solicitar o adiamento do pagamento da renda. Anuiu, com um trejeito que me doeu mais do que um indeferimento. Regressei a casa, dirigindo-me à casa de banho, onde me cruzei com os pÃncaros da vergonha. Sem trabalho e sem dinheiro, também não tenho papel higiénico. Ontem, imprevidente, depositei no lixo jornais do meu paÃs já dissecados, pelo que nada restava. Ao motim espiritual associaram-se pérfidas turbulências intestinais. Confesso que, nesse momento, pensei em cortar os pulsos, mas recuei porque a humilhação assumiria contornos intoleráveis até na morte. Imaginem o que sentiria a minha mulher quando chegasse a casa e encontrasse o marido pusilânime, morto e sentado sobre uma almofada de merda. Não. Até na morte é necessário preservar a dignidade.
In Estranho Estrangeiro